A experiência do cliente gera relevantes dados de comportamento que superam qualquer pesquisa na qualidade da coleta de dados. Mas a inteligência para lidar com essas informações ainda pode ser um empecilho para muitas organizações, especialmente no varejo
Já é comum o usuário de internet realizar uma pesquisa no Google sobre um produto ou serviço qualquer e, quase instantaneamente, receber uma publicidade direcionada em suas redes sociais, exatamente com o conteúdo buscado minutos antes — ou ver aquele mesmo produto ou serviço oferecido em sites de vendas e marketplaces. Essa estratégia, no ambiente digital, busca oferecer a melhor experiência com base em dados oriundos do comportamento do consumidor.
E quando falamos sobre o varejo offline? Redes de supermercado e comércios de bairro, como farmácias e lojas de rua, precisaram acelerar a digitalização na pandemia, mas seus pontos físicos, muitas vezes estrategicamente escolhidos, representam ativos de valor para as marcas, seja por questões de faturamento, seja de branding.
Bart de Langhe, cientista comportamental e professor de marketing da Universitat Ramon Llull (Esade), e Stefano Puntoni, professor de marketing na Rotterdam School of Management (Erasmus University) e diretor do laboratório Psychology of AI no Erasmus Centre for Data Analytics, expõem uma interessante ideia de “analytics de dados orientada por decisões”. O conceito parece prático, especialmente se pensarmos em varejo offline e sua integração com o online: “em vez de buscar um propósito para dados, é preciso buscar dados para um propósito”.
Em resumo, as decisões tomadas com base em dados sempre estão ancoradas no que se tem à mão, o que pode levar a perguntas erradas e soluções incompatíveis. Sabendo qual decisão deve ser tomada, é possível compreender quais dados são realmente necessários.
Segundo de Langhe e Puntoni, há três passos para que esse método funcione:
Identificar possíveis caminhos — Para escapar de decisões em piloto automático, é necessário começar abrindo a mente. Imaginar outras alternativas a questões cotidianas pode melhorar a qualidade das decisões. No entanto, o excesso de alternativas pode tornar o problema intratável. “A certa altura, portanto, os responsáveis por decidir devem fechar a mente – ou usar seu critério para enxugar o rol de opções.”
Determinar dados necessários para ranquear alternativas — Com novos caminhos imaginados no primeiro passo, é necessário ter critérios para classificá-los. O objetivo dessa análise é “converter incógnitas em fatos comprovados para que cursos alternativos de ação possam ser ranqueados de forma mais objetiva”.
Em evento da MIT Sloan Review Brasil, Jorge Franchella, CDO da Natura &CO, reforça a importância da capacidade de captura e gestão dessas incógnitas. “Em suma, precisamos ser capazes de entender o que os dados estão nos falando para individualizar e personalizar a experiência, mas não dá para isso ser fragmentado.”
É aqui que entra a inteligência artificial, colaborando para o ganho de escala na individualização do contato com os clientes, criando um padrão único de serviço e experiência. “As interpretações que eu tenho desses dados têm que ser uniformes em todos os pontos de contato, eu preciso da capacidade de processar esses dados, entender o que eles dizem a respeito das pessoas e essa experiência precisa ser única. Isso demanda questões associadas à governança, arquitetura, plataforma, a forma que eu capturo os dados e os utilizo precisa ser transversal”, explica Franchella.
Um exemplo é trazido por Stefan Thomke em relação à plataforma Booking.com. Por meio de testes A/B, sempre visando a melhor experiência do consumidor, a equipe das áreas de produto e tecnologia descobriu que o melhor estímulo aos clientes é o medo de perder uma reserva. Soma-se a isso o fato de que é necessário converter essa sensação em um bom negócio ao encontrar os melhores preços. “Isso representa remover os atritos do processo”, explica o professor de Harvard.
Escolher o melhor curso de ação — Caso novas alternativas tenham sido abertas e os dados corretos estejam disponíveis para entendê-las, decidir por qual caminho seguir deve ser uma consequência lógica dos primeiros passos.
Este novo modelo trouxe como proposta inserir o negócio em uma nova realidade tecnológica, agilizando a coleta de informações do público. Mais do que um produto de qualidade, os consumidores buscam uma relação de proximidade com esse processo – aprender, tocar, escolher, conhecer, comparar, avaliar. O ambiente digital é o canal para a interação e fortalecimento dos vínculos no ambiente virtual e físico.
Para Norberto Tomasini, head de retail da Everis | NTT DATA, UX deve abarcar todos os fatores que contribuem para a percepção geral do usuário. “As necessidades dos clientes são atendidas? É rápido, atraente e intuitivo? Toda essa estratégia deve considerar os diversos aspectos que atuam para construir a experiência: preferências, crenças, emoções, percepções, respostas físicas e psicológicas do usuário, entre diversos outros aspectos.”
No universo de dados, Stefan Thomke, professor de administração de empresas da Harvard Business School, relembra o papel das emoções na experiência e mostra que, sim, elas podem virar informações. Uma vez que um relatório do Gallup mostra que as empresas que otimizam as conexões emocionais superam as rivais em 85% no aumento das vendas, ele aponta um erro de estratégia: “A maioria se concentra em reduzir queixas, para eliminar a dor do cliente. É uma estratégia míope, que despreza muito do ocorrido na jornada dele.”
Como encontrar dados em emoções? Novamente, o comportamento pode dizer muito mais do que dados demográficos, ticket médio, dentre outros que qualquer empresa possui. Thomke ilustra com a tentativa de revitalizar o setor de TVs da Sony. O design, embora bem avaliado, tinha a ressalva de que os consumidores reclamavam dos fios visíveis. A frase do então CEO, Kazuo Hirai, para avaliar a evolução dos trabalhos era simples: “ainda vejo os fios”. Três anos depois, a Sony encontrou uma solução que ocultasse os fios e o executivo concluiu: “a Sony não compete mais baseada em especificações técnicas, e, sim, na experiência emocional dos consumidores”.
Para ampliar o debate e entender a aplicação prática desses conceitos, a MIT Sloan Review Brasil e a Everis | NTT DATA promovem uma round table em 14 de setembro, com o tema Varejo: consumo de dados para entrega de experiências. Os painelistas são Bruno Pipponzi, health business VP na RaiaDrogasil, e Marcelo Arantes, diretor executivo de supply no Grupo Pão de Açúcar. Norberto Tomasini, head de retail na Everis e Gabrielle Teco, CEO da Qura Editora e diretora-executiva de MIT Sloan Review Brasil, como mediadora, completam o time.
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